Com a raiva de um torpedo
Furando o fundo do mar
Uma ave no oceano
Procurando onde pousar
Eu sei que esse voo é cego
De morcego sem radar
Só a fúria do trovão
E a lama ribanceira
Atravesso a noite escura
Sem saber tempo ou lugar
Chuva grossa, céu de chumbo
Riacho virando mar
Nem sei se ela ainda me espera
Com espanto no olhar
Ou se a luz dos olhos dela
Foi na correnteza
O rio levou a rua, levou casa, levou bicho
O rio levou meu sonho como se fosse lixo
Com a vista enxovalhada
Na luz fraca da manhã
Agachado ao chão de lama
Homem sapo, homem rã
Nem sei pra que sirvo agora
Minha chama se apagou
Cheguei mas não deu mais tempo
De salvar o meu amor
O rio levou a rua, levou casa, levou bicho
O rio levou meu sonho como se fosse lixo
Com a raiva de um torpedo
Furando o fundo do mar
Uma ave no oceano
Procurando onde pousar
Eu sei que esse voo é cego
De morcego sem radar
Só a fúria do trovão
E a lama ribanceira
A voz rouca que vem do choque das águas
Que engrossa o couro da chuva
Que desce em cada riacho
Brota das montanhas
E avança surda no arrastão de tudo
O rio em fúria é tão arredio quanto cruel
E sua fuga, fúria líquida, líquida liquida
Que deixa pra trás cidades fantasmas
Ruínas na alma
E o silêncio da lama tapando meus ouvidos