Era 4:30, passava um pouquinho
E um fosco clarinho rasgava o varjão
Era o trem noturno, que vinha apontando
E logo parando na velha estação
Meu corpo tremia, meus olhos molhados
O meu pai do lado e a mala no chão
Beijei o seu rosto e disse na hora
O mundo lá fora me espera paizão
Entrei no vagão, corri pra janela
E a mala amarela do velho catei
O trem deu partida, soprou bruscamente
E ali novamente sua mão eu beijei
Um pouco pra adiante vi minha casinha
E a minha mãezinha de pé no portão
Ela não me viu e no trem na corrida
Ouvi as latidas do velho sultão
Um certo senhor da poltrona vizinha
Me dizia que vinha do Paranazão
E disse também de um jeito cortês
É a primeira vez que deixo o sertão
Pedi seu conselho e ele me disse
Seu moço a velhice é dura demais
Eu sou bem mais velho e posso aconselhar
É duro ficar distante dos pais
Eu nunca esqueci o que o velho falou
O tempo passou e pra casa voltei
Quem fica distante jamais se conforma
Lá na plataforma meus pais avistei
Desci comovido, abracei ele e ela
E mala amarela meu filho eu não vi
Meu pai acredite na fala de um homem
Pra não passar fome a mala eu vendi
Que pena, que pena, era minha lembrança
Que eu trouxe de herança do seu avô
Mais deixa pra lá, eu vou esquecer
A herança é você e você já voltou
De que me adianta viver na cidade
Se a felicidade não me acompanhar?
Adeus, paulistinha do meu coração
Lá pro meu sertão, eu quero voltar
Ver a madrugada, quando a passarada
Fazendo alvorada, começa a cantar
Com satisfação, arreio o burrão
Cortando estradão, saio a galopar
E vou escutando o gado berrando
Sabiá cantando no jequitibá
Por Nossa Senhora, meu sertão querido
Vivo arrependido por ter te deixado
Esta nova vida aqui na cidade
De tanta saudade, eu tenho chorado
Aqui tem alguém, diz que me quer bem
Mas não me convém, eu tenho pensado
Eu digo com pena, mas esta morena
Não sabe o sistema que eu fui criado
Tô aqui cantando, de longe escutando
Alguém está chorando com o rádio ligado
Que saudade imensa do campo e do mato
Do manso regato que corta as campinas
Aos domingos ia passear de canoa
Nas lindas lagoas de águas cristalinas
Que doce lembrança daquelas festanças
Onde tinham danças e lindas meninas
Eu vivo hoje em dia sem ter alegria
O mundo judia, mas também ensina
Estou contrariado, mas não derrotado
Eu sou bem guiado pelas mãos divinas
Pra minha mãezinha já telegrafei
E já me cansei de tanto sofrer
Nesta madrugada, estarei de partida
Pra terra querida que me viu nascer
Já ouço, sonhando, o galo cantando
O inhambu piando no escurecer
A Lua prateada clareando as estradas
A relva molhada desde o anoitecer
Eu preciso ir pra ver tudo ali
Foi lá que nasci, lá quero morrer