Quem te batizou, milonga, decerto foi algum monge
Que escutou de muito longe o teu murmúrio de sanga
Ou quem sabe alguma changa dormideira dos arreios
Dessas que fazem ponteios com unhas de japecanga
Dessas que fazem ponteios com unhas de japecanga
Ou quem sabe algum sorsal de topete Colorado
Num prelúdio abarbarado das canas do taquaral
Talvez, quem sabe, um bagual, corcoveando num repecho
Floreando as cordas do queixo nas pontas do pastiçal
Brasileira, castelhana, milonga ronco de mate
Tu nasceste do embate da velha saga pampeana
Espanhola, lusitana, entre patriadas e domas
Sem divisas, sem diplomas, cursando o mesmo dialeto
Porque o vento analfabeto fala em todos idiomas
Quem sabe, talvez, a lança, riscando a primeira linha
Quando a adaga sem bainha, cadenciava uma romanza
Ou talvez a vaca mansa dentro da várzea perdida
Na ternura enrouquecida feita de instinto e lamento
Anunciando o nascimento da cria recém lambida
Por isso em qualquer fronteira, no esboço da lonjura
És a mais linda mistura da nobre estirpe campeira
Fidalga e aventureira com geografia na cara
Passaporte tapejara no caminho dos andejos
Reculutando solfejos que uma linha não separa
Alma de pampa e semente que nasceu nos dois costados
Herança dos mal domados que formaram nossa gente
O passado e o presente e o futuro dimensionas
Nas primas e nas bordonas do garrão do continente
Nas primas e nas bordonas do garrão do continente