Passei minha vida morando no mato
Aradando terra, arrancando toco
Toquei fogo em broca, era aquele sufoco
Colhia feijão e vendia barato
Criava um cachorro, uma vaca e um gato
Um burro ligeiro pra eu trabalhar
A minha casinha, o meu sabiá
Não tinha dinheiro, mas tinha vontade
De ganhar o mundo e na grande cidade
Tomar uma cana na beira do mar
Em mil novecentos e noventa e dois
Resolvi fazer uma plantação
Com falta de chuva e com muita oração
Plantei na minha roça uma tarefa de arroz
Aguei a terra e um tempo depois
Fiquei satisfeito em poder trabalhar
Colhi o arroz, botei pra secar
O vendi na feira e peguei o dinheiro
Comprei uma passagem pro Rio de Janeiro
Pra ver o Pão de Açúcar da beira do mar
Quando eu fui descendo na rodoviária
Chegou um moleque de cabelo liso
A cabeça baixa e entristecido
Olhou para mim e foi logo dizendo
Tô passando fome, tô quase morrendo
Me dê sua mala, deixe eu carregar
Eu, todo animado, o deixei me ajudar
Quando percebi que fiz uma besteira
Pegou minha mala e saiu na carreira
Soltando risadas na beira do mar
Ainda tive sorte que a minha carteira
No bolso da calça estava escondida
Cheguei lá na praia com a cara mais lisa
Fiquei numa barra de palha e madeira
Pedi uma dose, sentei numa cadeira
Tirei a camisa e fui me embriagar
Chamei uma loira para conversar
E no lugar dela veio seu namorado
Fiquei lá na praia todo arrebentado
Com a cara enfiada na beira do mar
E nesse momento fiquei com saudades
Do meu Juazeiro, do meu Cariri
E dessa viagem me arrependi
Pois vi que perdi minha liberdade
As cidades grandes são grandes cidades
Mas não são melhores que o meu Ceará
Que qualquer posso frequentar
E encher de amor o meu coração
Prefiro os costumes desse meu sertão
Do que tomar cana na beira do mar